Poema ou conto épico, escritura religiosa, tratado filosófico e história nacional – sendo tudo isso e um pouco mais, o Mahābhārata é o maior repositório de conhecimento sobre o pensamento e a vida na Índia Védica e Clássica. Existem muitas versões do Mahābhārata (na forma oral, textual e performativa). De fato, ele é melhor entendido como uma tradição narrativa do que um texto limitado.
Com cerca de 100.000 versos em Sânscrito Clássico, é um dos épicos mais longos e mais antigos do mundo. Sua versão mais longa, encontrada em manuscritos, consiste em mais de 100.000 ślokas (versos com duas linhas e 4 quartos) ou mais de 200.000 linhas de versos individuais (duas metades de um verso). Com cerca de 1,8 milhão de palavras no total, o Mahābhārata é aproximadamente dez vezes o comprimento da Ilíada e da Odisséia combinadas, ou cerca de quatro vezes o comprimento do Rāmāyaṇa, o segundo maior épico indiano e, segundo a tradição indiana, ainda mais antigo que o primeiro.
O Mahābhārata conforme recitado por Ugraśrava Sauti tem mais de 100.000 versos e o texto sânscrito sobrevivente mais antigo (manuscrito) data do Período Kushan (200 DC). Muitos historiadores estimam a data da guerra de Kurukshetra para a Idade do Ferro na Índia, em torno do século 10 AC. O cenário do épico tem um precedente histórico na Índia da Idade do Ferro (védica), onde o reino Kuru era o centro do poder político durante aproximadamente 1200 a 800 AC.
Uma outra datação refere-se à guerra no final do 4º milênio antes de Cristo e, tem uma conexão com o cálculo da época chamada Kali Yuga, com base em conjunções planetárias, por Aryabhata (século 6 DC). A data de Aryabhata de 18 de fevereiro de 3102 aC para a guerra do Mahābhārata tornou-se generalizada na tradição indiana. Algumas fontes marcam isso como o desaparecimento do Senhor Krishna da Terra. Contudo, até hoje, não se tem uma data confirmada sobre a guerra, nem sobre a origem do Mahābhārata.
Essas divergências não existem somente com referência a datação. Por exemplo, a primeira seção do Mahābhārata afirma que foi o Senhor Ganesha quem escreveu o texto ditado por Vyāsa, mas isso é considerado por alguns estudiosos como uma interpolação posterior ao épico original. Como estes, existem vários pontos de divergência entre a versão acadêmica e a tradição de ensinamentos indiana.
A narrativa principal do Mahābhārata, que inclui a BhagavadGita, relata o amargo conflito entre os cem filhos do rei cego Dhritarashtra e seus primos, os cinco filhos do rei Pandu. Em última análise, esse conflito se transforma em uma guerra devastadora que coloca família contra família, guru contra discípulo e amigo contra amigo. Embora os Pandavas triunfem no final, ainda assim eles sofrem, já que quase todos os seus entes queridos perecem na guerra.
No entanto, o escopo do Mahābhārata é muito mais amplo do que a guerra entre mocinhos e bandidos e, sua estrutura narrativa é muito mais complexa, possuindo várias histórias tecidas dentro de histórias. Também, é muito mais filosófico do que outro textos produzidos mais tarde.
A autoria do texto é tradicionalmente atribuída ao sábio Veda-Vyāsa, que também é uma personagem importante no épico. Veda-Vyāsa descreveu-o como sendo itihāsa (história do povo indiano). Ele também descreve a tradição Guru-shishya, que traça todos os grandes professores e seus alunos dos tempos védicos.
O épico emprega a estrutura de ‘uma história dentro de outra história’, também conhecida em Ingês como ‘frametales’, e que é uma estrutura popular em muitas obras religiosas e não religiosas indianas. A própria narração do texto conta que o Mahabharata é recitado pela primeira vez em Takshashila pelo sábio Vaiśampāyana, um discípulo de Vyāsa, ao rei Janamejaya que era o bisneto do príncipe Pāṇḍava Arjuna. A história é, então, recitada novamente por um contador de histórias profissional chamado Ugraśrava Sauti, muitos anos depois, para uma assembléia de sábios que estavam realizando um ritual sacrificial, com duração de 12 anos, para o rei Saunaka Kulapati na Floresta Naimiśa.
Várias histórias dentro do Mahābhārata assumiram identidades próprias na Literatura Sânscrita Clássica. Por exemplo, Abhijñānaśākuntala, texto em Sânscrito do renomado poeta Kālidāsa (aproximadamente 400 DC), que se acredita ter vivido na era da dinastia Gupta, é baseado em uma história que acredita-se ser conectada com o Mahābhārata. Urubhaṅga, uma peça sânscrita escrita por Bhāsa, que se acredita ter vivido antes de Kālidāsa, é baseada na morte de Duryodhana, pelo ferimento de suas coxas causado por Bhīma.
om nārāyaṇaṃ namaskṛtya naraṃ caiva narottamam.
devīṃ sarasvatīṃ caiva tato jayamudīrayet..
— Vyasa, Mahabharata
“Om! Tendo se curvado em saudação a Narayana (Shri Krishna) e Nara (Arjuna), o mais exaltado entre os seres humanos, e também (saudado) a deusa Saraswati, Jaya (Mahabharata) deve ser falado (declarado, ensinado).”
(Continua numa próxima publicação.)